Como escrever uma boa carta de apresentação. 6 conselhos e 2 exemplos

O que dizem os especialistas
Os especialistas dizem que a carta de apresentação é necessária. “Não a enviar é sinal de preguiça. Equivale a cometer erros de ortografia e de gramática no currículo. É algo que não se faz”, diz Jodi Glickman, especialista em comunicação e autora de “Great on the Job”. John Lees, um estratega de carreiras do Reino Unido e autor de “Knockout CV”, concorda e explica que, mesmo que apenas metade das cartas de apresentação sejam lidas, ainda restam 50% de possibilidades de que o facto de incluir uma o ajude. “É uma oportunidade para se distinguir”, acrescenta Glickman. Mas, como toda a gente que já escreveu uma carta de apresentação sabe, não é fácil escrevê-la bem. Veja como dar aos recrutadores aquilo que eles querem.

1. Faça uma pesquisa inicial
Antes de começar a escrever, descubra mais acerca da empresa e do trabalho específico que pretende. Analise o website da empresa, o Twitter dos seus executivos e o perfil dos empregados no LinkedIn. “Faça alguma pesquisa além da leitura da descrição do posto de trabalho”, aconselha Lees. Descubra quais são os desafios que a empresa enfrenta e como a sua função ajudaria a lidar com eles. Conhecer melhor a empresa ajuda-o a escolher o tom correto a usar na sua carta de apresentação. “Pense na cultura da organização à qual se candidata”, é o conselho de Glickman. “Se for uma agência criativa, como uma oficina de design, pode arriscar mais, mas se for uma organização conservadora, como um banco, é preferível ser mais contido.”

2. Faça uma abertura forte
“As pessoas, normalmente, começam por escrever ‘Estou a candidatar-me ao emprego X, que vi no lugar Y.’ É um desperdício de texto”, avisa Lees. Em vez disso, inicie a carta com uma frase forte. “Comece com a frase-chave — por que razão este emprego o entusiasma e você é a pessoa certa para ele”, diz Glickman. Por exemplo, pode escrever, “Sou um profissional de angariação de fundos na área ambiental, com mais de 15 anos de experiência, e adoraria contribuir com os meus conhecimentos e entusiasmo para a vossa equipa em constante desenvolvimento”. Provavelmente o recrutador está a ler uma pilha de cartas, por isso tem de lhe chamar a atenção. Mas não tente ser engraçadinho. “O humor normalmente não resulta, ou parece egocêntrico”, diz Lees. Abstenha-se também dos lugares-comuns. “Diga algo direto e dinâmico, como ‘Antes de continuar a ler, permita-me chamar-lhe a atenção para duas razões pelas quais poderá querer contratar-me…’

Se tiver uma relação pessoal com a empresa ou com alguém que ali trabalhe, não deixe de o mencionar na primeira ou na segunda frase. E enderece a sua carta a alguém específico. “Com as redes sociais, não há desculpa para não descobrir o nome de um responsável de recursos humanos”, afirma Glickman.

3. Enfatize o seu valor pessoal
Os recrutadores procuram pessoas que possam ajudá-los a resolver problemas. Com base na pesquisa que fez anteriormente, mostre que sabe o que a empresa faz e que conhece alguns dos desafios que enfrenta. Estes não têm de ser específicos, mas pode mencionar uma tendência que afete o setor. Pode escrever, por exemplo, “Muitas empresas de prestação de cuidados de saúde estão a debater-se para perceber como a alteração das leis irá afetar a sua capacidade de fornecer cuidados de saúde de elevada qualidade”. Em seguida, indique como a sua experiência o equipou para responder a essas necessidades, talvez explicando como resolveu um problema semelhante no passado, ou partilhando uma das suas concretizações relevantes.

4. Transmita entusiasmo
Deixe claro por que razões pretende o trabalho. “Na economia atual, muitas pessoas têm as capacidades certas, pelo que os empregadores querem alguém que deseje, efectivamente, o trabalho”, diz Glickman. “O entusiasmo transmite personalidade”, acrescenta Lees, que sugere que se escreva algo como “Gostaria muito de trabalhar para a vossa empresa. Quem não gostaria? Vocês são os líderes do setor, estabelecendo os padrões que os outros se limitam a seguir”. Não se dê ao trabalho de enviar uma candidatura se não estiver entusiasmado acerca de algum aspeto da empresa ou da função. “Enviar 100 currículos é uma perda de tempo. Descubra 10 empresas para as quais gostava de trabalhar e dedique-se a essas, de alma e coração”, sugere Glickman. Ao mesmo tempo, não exagere nas lisonjas nem diga nada que não seja sincero. A autenticidade é fundamental. “Não quer certamente parecer um adolescente demasiado efusivo”, alerta Glickman. Seja profissional e maduro. Lees salienta que em alguns setores, como a moda ou a tecnologia, é mais adequado exprimir o seu gosto por alguns produtos ou serviços da empresa. Uma boa regra é “usar o estilo de linguagem que o recrutador usaria com um dos seus clientes.”

5. Escreva um texto curto
Muitos dos conselhos que pode encontrar sugerem que escreva uma carta com menos de uma página completa. Mas, tanto Glickman como Lees, afirmam que é preferível ser ainda mais breve. “A maioria das cartas de apresentação que vejo são demasiado longas”, diz Lees. “A carta deve ser suficientemente curta para poder ser lida com um olhar”. Tem de cobrir muita coisa, mas de forma sucinta.

6. Quando não pode enviar uma carta de apresentação
“No buraco negro de um sistema online, as regras podem ser diferentes”, admite Glickman. Muitas empresas hoje em dia utilizam sistemas de candidatura online que não permitem uma carta de apresentação. Poderá descobrir como incluir uma no mesmo documento do currículo, mas não há garantia, especialmente porque alguns sistemas apenas admitem a introdução de dados em caixas específicas. Nestes casos, use os formatos que lhe são concedidos para demonstrar a sua capacidade de realizar o trabalho e o seu entusiasmo pela função. Se possível, tente arranjar alguém a quem possa enviar um breve email de seguimento, salientando alguns pontos-chave da sua candidatura.

Princípios a recordar
A fazer:
a. Use uma frase de abertura forte, que torne claras as razões pelas quais pretende o emprego e é a pessoa certa para ele

b. Seja sucinto — um recrutador deve poder ler a carta de apresentação com um único olhar

c. Partilhe uma concretização que prove a sua capacidade de lidar com os desafios que o empregador enfrenta

A não fazer:
a. Tentar ser engraçadinho — a maioria das vezes não resulta

b. Enviar uma carta de apresentação genérica — personalize a carta para cada posto de trabalho específico

c. Exagerar nas lisonjas — seja profissional e maduro

Dois exemplos
Estudo de Caso#1: Mostre que compreende aquilo de que a empresa necessita
Michele Sommers, vice-presidente de RH da Boys & Girls Village, uma organização sem fins lucrativos no Connecticut, publicou recentemente um anúncio para um especialista em recrutamento e formação. “Procurava alguém com muita experiência de recrutamento, que pudesse fazer tudo, desde arranjar candidatos até ao acolhimento dos novos contratados”, explica. Também pretendia que a pessoa fosse capaz de aprender sozinha. “Somos uma equipa pequena e não tenho possibilidade de formar ninguém”, afirma.

Houve mais de 100 candidaturas ao posto de trabalho. O sistema de candidatura online da organização não permite anexar cartas de apresentação, mas uma das candidatas, chamemos-lhe Heidi, enviou um email de acompanhamento depois de submeter o seu currículo. “Foi bom tê-lo feito, pois, caso contrário, teria sido eliminada”, conta Michele.

O currículo de Heidi dava a ideia de que saltava continuamente de emprego em emprego— períodos muito curtos em cada função anterior. Michele partiu do princípio que ela não tinha grande desempenho e passava o tempo a ser despedida. Era também a única candidata que não possuía uma licenciatura de quatro anos.

Mas o email de Heidi chamou a atenção de Michele. Em primeiro lugar, era profissional. Heidi afirmava claramente que escrevia para confirmar se a sua candidatura fora recebida. Continuava, explicando como obtivera o nome e os dados de Michele (através do patrão do marido que fazia parte do conselho diretivo) e a sua ligação pessoal à Boys & Girls Village (o sogro realizara algum trabalho na organização).

Mas o que chamou efetivamente a atenção de Michele foi o facto de Heidi conhecer bem o grupo e os desafios que enfrentava. Fizera o seu trabalho de casa e “listara algumas coisas que ela faria ou já tinha feito, que ajudariam a resolver essas necessidades”.

“A personalidade e paixão que ela transmitia na carta de apresentação também foram visíveis na entrevista telefónica”, conta Michele. Heidi acabaria por se mostrar mais do que qualificada para o trabalho. “Eu queria, desde o início, que esta função fosse mais importante, mas não me parecia possível. Quando a conheci, percebi que a expansão era possível.” Três semanas mais tarde, Michele ofereceu o trabalho a Heidi, que o aceitou.

Estudo de Caso #2: Chame a atenção
Ao longo dos últimos quatro anos, Emily Sernaker candidatou-se a várias posições no International Rescue Committee (IRC). Nunca desistiu. A cada candidatura, enviava uma carta de apresentação personalizada. “Queria que a minha carta de apresentação salientasse as minhas qualificações, pensamento criativo e respeito genuíno pela organização”, declara.

Sarah Vania, a diretora regional de RH da região, diz que as cartas de apresentação de Emily lhe chamaram a atenção, especialmente porque incluíam várias ligações de vídeo que mostravam os resultados do trabalho de promoção e angariação de fundos de Emily noutras organizações. Emily explica, “Eu tinha experiência na defesa de antigas crianças-soldado, sobreviventes de tráfico humano, mulheres vulneráveis e refugiados. Uma coisa é fazer afirmações numa carta de apresentação, do género, ‘Sou capaz de fazer um discurso, sou uma pessoa criativa, sou prestável’, mas demonstrar essas qualidades parecia-me uma maneira melhor de convencer um recrutador de que as afirmações eram verdadeiras.”

Eis o que Emily escreveu a Sarah sobre o vídeo:
Este é um pequeno vídeo acerca da minha história no ativismo. A organização sem fins lucrativos Invisible Children realizou-o para uma conferência juvenil na qual falei este ano. Tem cerca de quatro minutos.

Como perceberá no vídeo, tive muito sucesso enquanto angariadora de fundos, reunindo mais de 200 mil dólares para a Invisible Children. Desde então tenho trabalhado como consultora para a Wellspring International e concluí recentemente os meus estudos com uma bolsa da Rotary International.

Em todas as cartas de apresentação, Emily também deixou claro o quanto queria trabalhar para o IRC. “Transmitir entusiasmo é algo que nos torna vulneráveis e pode ser visto como ingenuidade mas, no meu caso, o meu entusiasmo pela organização era genuíno e pareceu-me correto exprimi-lo”, diz ela.

Eis como Emily transmitiu o seu interesse em trabalhar para o IRC:

Quero também que saibam que aprecio sinceramente o IRC. Apreciei os conhecimentos que obtive acerca dos vossos programas e visitei pessoalmente as vossas instalações em Nova Iorque, a quinta New Roots em San Diego, e as exposições “We Can Be Heroes” e “Half the Sky” em Los Angeles. O IRC é a minha primeira escolha e acredito que serei um contributo valioso para a vossa equipa de angariação de fundos.

Emily compreendeu ao longo do processo que a organização tinha centenas de candidatos para cada posição e que havia uma forte competição. “Conclui que não seria a melhor escolha para cada posto, mas não deixei de crer que tinha um contributo significativo a fazer”, diz. Finalmente, a persistência de Emily foi recompensada. Em Junho passado, foi contratada como coordenadora temporária de relações externas e, em Outubro, foi transferida para um cargo permanente.

Amy Gallo
escreve regularmente para a Harvard Business Revie. Siga-a no Twitter

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